Era oito e cinco da manhã, ainda fazia frio e sequer eu tinha colocado a cafeteira para trabalhar. Mas o computador já estava funcionando e a internet conectada. Nem lembro se tinha escovado os dentes ou lavado o rosto. Criei o hábito de levantar, calçar as sandálias, caminhar sonambulamente até o escritório e apertar o botão. Acho que viciei no barulho da placa de vídeo despertando ou talvez goste de imaginar que existe algo funcionando primeiro do que eu. Entre um bocejo e outro, faço minha revista diária por alguns sites e blogs, mas hoje, especialmente hoje, decidi entrar no que se chama de grandes portais de notícias (embora não faço idéia do que isso queira dizer hoje em dia). E então, lá estava a foto dela. Mal meus olhos permitiam se abrir para a leitura da manchete, eu reconhecia a imagem. Pulso ao ar, sorriso malandro de quem acaba de cumprir uma missão boba. Sorriso de quem ainda não percebeu a grandiosidade da conquista. Lá estava: “Ketleyn ganha 1ª medalha olímpica do judô feminino do Brasil!”
Era ela. Para narrar o que senti, a voz humana, ou os vocabulários disponíveis, não são suficientes. Por que é tão difícil descrever sensações? Arrepiei-me, vibrei junto com ela, sai com vontade de gritar ‘Ketleyn!’ pelas janelas – como faço nos suados gols do meu Bahia. Cheguei a sentir o gosto salgado de uma lágrima que ganhou meu rosto, o calafrio ágil dos pêlos em pé. Eu repetia várias vezes o título do texto. Completamente acordado, tive que repetir para que eu mesmo acreditasse. Senti vergonha de não ter acreditado tanto assim naquela tarde sentados no tatame. Não que duvidasse. No fundo eu já torcia desde ali, mas não existiu em momento algum uma crença sincera, uma certeza de que um dia eu acordaria, ligasse o computador e visse sua foto em todos os sites, sua voz em todas as rádios, sua imagem em todas as TVs.
Ketleyn Quadros, 20 anos, judoca, estudante de educação física, atleta do Minas Tênis Clube, havia há três meses interrompido um treinamento e se colocado a minha disposição para a gravação do quinto vídeo do FIZ + Sotaques. Na conversa, que falava sobre o lado B do Esporte e coloca em questão se ele era saúde ou não, Ketleyn, residente de uma república feminina em Belo Horizonte, que até 7h dessa manhã mal era localizada pelo google, mostrou total determinação. Lembro de frases fortes e de como elas me irradiavam de vontade de vitória, de sede de conquista. Ketleyn, que deixou a família na cidade satélite de Ceilândia, virou, merecidamente, uma celebridade. Talvez o nome que mais se propagou no google nas últimas horas e que eu, entrevistador de carteirinha, tenho orgulho de ter ouvido antes de toda imprensa brasileira. Mas mais que isso, tenho orgulho de ter a conhecido e ter compartilhado sua determinação com todos que viram o vídeo.
O esporte é a vida, mas num outro ritmo!
Leandro Lopes
Um comentário:
Deu para sentir daqui sua emoção, Leo. Aliás, é uma emoção de todos nós, enquanto brasileiros. A mesma simplicidade que ela fala no vídeo, é a que manteve depois da medalha.
Parabéns a essa campeã!
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